sábado, 12 de abril de 2008

FORAGIDOS


Olá!
Novidades?
Não ouvi nenhuma que colocasse o mundo em um rumo melhor; só a Fé; esse sentimento de inexplicável certeza, nos move!
Boa Leitura!

A luz do computador ilumina o quarto, escrever com todos dormindo é mais produtivo, fico mais concentrada e não sou dispersada pelo movimento normal do dia. Enquanto dormem, o meu peito se aquece em sabê-los bem, minha alma fica tranqüila, meu espírito se alegra.
Não tenho sonhos complicados, me satisfaço com o aconchego desse povo que me cerca e me enche de amor. Penso como a vida tem sido estranha conosco, e que como nos coloca a prova a cada momento; muitos conseguiram a chance da liberdade legal; nós sempre tentamos, mas só conseguimos conviver foragidos, buscando esperando...
Nunca tivemos problemas externos, como amantes ou a indiferença, temos uma vida sexual saudável e gostamos de estar juntos, temos filhos legais, mas nunca o horizonte que vemos a nossa frente, se aproxima o bastante para que possamos alcançá-lo; essa liberdade que vemos de longe nunca foi nossa; mas sabemos que a nós pertence mais que a luta que nos está sendo oferecida há muitos anos, e que construímos a despeito do tempo e da distância, um sentimento forte que se completa e se alegra em saber simples, possível e recíproco.
Apesar das grades, formamos uma família há vinte e quatro anos; tempo maior do que muitos que tiverem a chance de vivenciarem a liberdade em família, e que nunca percebeu a importância desse amor.
No cômpito geral acho que estamos em vantagem, agregamos valor ao que sentíamos e as dificuldades nos fortaleceu e nos fez atravessar todos esses anos com amizade e respeito.
Acendo mais um cigarro; preciso parar, mas isso é uma outra história; enquanto a carne se sobrepõe à razão; dou mais uma tragada e lembro...



Bloco Comunicação, verão de 1976, me acabei no carnaval, saí todos dias, fiquei com bolhas enormes nos pés, minha mãe falou muuuuito: - No ano que vem não vai mais. Fiquei uma semana de molho sem poder andar direito.
Por morarmos perto do mar, o melhor passeio era sempre em direção a ele; tomar banho ou somente “lagartixar” na areia até torrar, na praia do Bogari, ou ir passear na direção dos Tamarindeiros; depois da Igreja de Nossa Senhora da Penha, surgia uma espécie de praça repleta de tamarindeiros, tinha épocas que estavam carregados e era a alegria da garotada; eram tantos da dava para levar para casa e fazer doce. O lugar da praia sempre estava cheio, e por ter árvores era escolhido por famílias e crianças para passar o dia ali; tipo picnic; cheiro de peixe frito, se misturava ao de tamarindo, continuávamos em frente passando pelo terminal de ônibus, até altura da Lélis Piedade; a principal, onde entravam os ônibus que vinham do terminal. Se entrássemos nela, a primeira transversal à esquerda era a minha rua, mas seguindo em frente, vinha o cais das barcas, que levavam passageiros para Paripe ou Piripiri, no largo da Ribeira a sorveteria era parada obrigatória, depois voltávamos a passear pela balaustrada; passávamos pela rua do Fogo e logo depois da curva vinha a praça onde reinava na sua frente o edifício REX, na curva era o antigo apartamento do meu avô; pai do meu pai, Juiz de Direito, morou ali até morrer velhinho, o Conselheiro Manoel Mattos. Era um prédio de três andares, logo depois vinha à casa de Tio Adhemar, continuando chegávamos até a escadaria do Hidroporto e continuávamos passando em frente ao colégio Amado Bahia, um antigo sobrado da família Amado Bahia, que virou colégio; mais um pouco o Clube de Regatas Santa Cruz aparecia; no segundo andar rolava uma “boatezinha” no final de semana.
Nessa altura atravessávamos a rua e Gracinha entrava em casa, nós entrávamos na primeira rua, onde Iran morava; Rita que era sua vizinha morava mais à frente e também entrava em casa, quando chegávamos no cruzamento da Rua do Fogo com a nossa, Isis tomava a sua direção e ia para casa; Olga, Olgahide e eu, continuávamos em frente, elas entravam primeiro, moravam mais perto do final da rua, eu seguia em frente chegando de novo quase na Lélis Piedade e entrava em casa.
Todos os dias esse era o roteiro, quando não havia nenhuma festinha ou ensaio da banda na casa das irmãs Olga; dávamos a volta na ponta da península, jogando conversa fora e olhando a vida dos outros. Tempos de puro “dolce far niente”, dos jogos de “baleado” na rua aos domingos. Fechávamos a rua e o campo era marcado no chão com giz; as equipes eram montadas, sorteávamos os lados e jogávamos a tarde toda. O jogo era de habilidade e resistência, o time conseguisse se esquivar das boladas em quem ela pegasse era “baleado” e tinha que sair do jogo e assim ia até que a última adversária fosse atingida com a bola, quem sobrava, vencia; várias meninas participavam, vinham até de ruas mais distantes jogar conosco; os meninos adoravam!
Nessa época não havia tempo ruim, e tudo era possível; éramos jovens!
Lembranças agradáveis de um tempo gostoso, como o cheiro da moqueca de peixe que minha mãe fazia numa panela de barro; pedaços generosos de peixe; com a cabeça, ela adorava; colocava sal, cebola, quentro, pimentão, rodelas de tomate, leite de côco e algumas pimentas de cheiro, no final regava tudo com azeite de dendê! Divinal! Para acompanhar, arroz branco, pirão com caldo do peixe, e uma farofa feita de cebola frita no dendê com bananas cortadas em rodelas.
Na nossa rua havia um vizinho que junto com a esposa fazia uma doce de banana maravilhoso, vinha gente de longe comprar, era famoso o doce. O cheiro das bananas misturado com o açúcar durante o preparo até se tornar doce, tomava conta da rua; era de dar água na boca tanto quanto o de acarajé da baiana da esquina ou o aroma do caldo de sururu que vinha do bar que ficava depois da loja de ferragens virando a esquina de casa.
O gosto da Paella que as nossas vizinhas; descendentes de espanhóis; faziam e eu sempre ia filar, maravilhosa!
Outra coisa que me lembro era a freqüência que íamos aos terreiros de candomblé para comer caruru, a maioria não era do candomblé, mas tínhamos amigas que eram, e quando tinha festa:- Ôpa, vai ter caruru? Távamos dentro!
Me lembro de ter comido muuuuito caruru, adolescente adora uma boca livre e nós não éramos diferentes, alguns garotos também iam. Às vezes era aniversário de alguém, mas sempre rolava um caruru e quando digo caruru era caruru completo, com vatapá, farofa de dendê, banana frita, frango a cabidela e muita pimenta.
Gostos e aromas maravilhosos da minha juventude; saborosas lembranças!

Namastê.

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